quarta-feira, 16 de janeiro de 2013

Esta semana assisti ao filme Idiocracy  que trata do idiotismo que transforma as gerações atualmente. O mundo não para e as mudanças ocorrem subitamente. Seriam todas elas bem-vindas a nossa formação intelectual, preservariam o acervo cultural adquirido durante milênios? Precisamos raciocinar a respeito e o texto abaixo nos propões essa reflexão, principalmente aos educadores que trabalham diretamente com a produção e a apropriação do conhecimento...

        


Internetês –linguagem do futuro?




Às vezes, como educadora me perco em indagações sobre o possível rumo que a língua portuguesa ou outras podem tomar. Durante o desenrolar dos tempos, revendo as brincadeiras que envolveram a linguagem, verifica-se que existiram e muitas vezes funcionaram como um treinamento cerebral da oralidade, um verdadeiro exercício de prosódia que para as crianças aceleravam o raciocínio e contemplavam o desenvolvimento e esperteza.
É o que se verifica na conhecida língua dos pês, uma febre que aconteceu na década de 60 que consistia em colocar um antes de cada sílaba das palavras do discurso, processo de difícil desenvolvimento no seu início que requeria atenção e rapidez de raciocínio. Exemplificando para aqueles que não conheceram e não conhecem a brincadeira: se quiséssemos dizer a frase “Eu vou amanhã” na língua do diria assim: Pe-eu-pe-vou-pe-a-pe-ma-pe-nhã.
Pelo exemplo, parece simples, mas no desenrolar de diálogos e pequenos textos trocados entre os falantes desta língua as habilidades de separação de sílabas aliada à inserção dos pês oferecia dificuldade quanto à rapidez que a oralidade exige no momento da comunicação.
À semelhança deste tipo de brincadeira existiram muitas outras como aquela de uma geração anterior a minha que consistia em colocar os sons ordei, ordai. Para mim, essa é complicada porque não participei ao vivo como meus pais desta atividade. Ao que parece, se fôssemos dizer, por exemplo, “Você vai hoje ao cinema?” soaria da seguinte forma: Voçordê vordai vordoje no cinordema? Analisando a estrutura da segunda frase não se consegue, para os não praticantes como eu, entender o mecanismo utilizado, ao que parece mantém-se os sons iniciais das palavras e antes dos fonemas nasais como o n não há a possibilidade da inserção pretendida.
E há conhecimento de muitas outras brincadeiras desse tipo como a letra das vogais a, e, i, o e u onde se trocam as vogais das palavras do texto por essas últimas à semelhança da música: O sapo não lava o pé, melodia adorada pelas crianças.
Atualmente, temos ciência do dicionário lançado pela conhecida atriz e apresentadora de programas infantis, sobre a língua dos xis que consiste em trocar fonemas alveolares como o ce, por exemplo, por xe como em você que soaria voxê. Segundo declaração da própria apresentadora, a publicação do dicionário autorizada pelo MEC não permitiu (pelo menos) que houvesse a mudança na palavra dicionário do título para dixionário. As crianças particularmente, adoraram esta brincadeira, mas quais as consequências destas mudanças aparentemente inocentes   quanto à grafia e prosódia destes vocábulos e ainda quais os benefícios ocorridos com esta novidade? Neste caso, o perigo é maior, pois temos um dicionário escrito com as "alterações de brinquedo" que somadas à idolatria dos pequenos pela artista podem levar à adoção de uma grafia imprópria indiretamente.
No caso das crianças, ainda há um grande período de permanência na escola, onde arduamente uma parcela de educadores interessados na Educação trabalha para fazer os devidos acertos quanto à conscientização da norma culta exigida pela sociedade podendo reverter o quadro.
O problema maior se apresenta agora na linguagem que acompanha a informação do futuro, que rege a comunicação entre os jovens, adultos e uma parcela mínima, acredito eu, de idosos, (uma vez que há a resistência a mudanças bruscas nesta fase da vida com raríssimas exceções): o internetês. Surgido do imediatismo que a velocidade das mensagens exige na internet, esse tipo de linguagem transforma totalmente o vernáculo eliminando a acentuação e pontuação além de usar de abreviaturas sistematicamente, muitas delas com base em termos anglófonos (do inglês), como é o caso do uso de lol- laughing out loud- rindo muito alto, como muitos conhecem. Do mesmo modo, não torna-se naum transformando a oralidade do ditongo nasal em forma escrita; um prato cheio para o ilustre Mattoso Câmara Júnior analisar, assim como outros linguistas atuais.
Inúmeras variações nesse sentido ocorrem ainda como a eliminação do ditongo nos grupos qu,como: quadro que se escreve qadro, q por que etc. Houve ainda o internetês dirigido a crianças e adolescentes, o miguxês, como axoxique etc. adequado ao uso do x à moda do dicionário da apresentadora supracitada. Tal obra publicada anteriormente seria já uma preparação intencional no sentido de preparação e adequação a essa mudança? Temos que raciocinar sempre, pois o que não existe é a inocência e não intencionalidade nas medidas tomadas pela mídia e seus representantes.
Por esse meio vitual veem-se ainda é como eh, a troca de um verbo por uma interjeição numa derivação imprópria se analisarmos à luz da gramática; hj ou oj ao invés de hoje,e já vemos até professores mais jovens escreverem por extenso oje no lugar de hoje sem contar com a inserção de fonemas isolados no lugar de interjeições como kkk no lugar  de há, há, há; e a utilização de emotions (pequenas imagens divertidas na representação de emoções) ao invés do relato dessa situação que prejudicaria a velocidade da informação. Há um velho ditado que afirma que a pressa é inimiga da perfeição, e se encararmos por esse ângulo, seremos capazes de compreender o imenso prejuízo que a redação moderna oferece ao escritor podendo conduzi-lo à comunicação monossilábica, solitária, falsamente social do aspecto de   diálogo face a face e extremamente sintética, em nada favorecendo ao exercício da escrita tão valorizada no campo profissional e educacional.
Por mais que o professor se esforce em trazer para a sala de aula esse problema, porque ele realmente é um obstáculo ao desenvolvimento de qualquer língua escrita e seu padrão socialmente aceito, e tente resolvê-lo, a habitualidade e pontualidade da comunicação virtual altamente repetitiva induz à fixação das estruturas do internetês, principalmente pelos adolescentes cujo comportamento induz à revolta a tudo que é tradicional. Sem mencionar o fato daqueles que fazem uso apenas de sites de relacionamento e bate-papos sem interesse por uma leitura mais formal como é o caso da maioria que utiliza a internet atualmente. O problema se agrava à medida que a pessoa não frequenta mais a escola, não lê matérias  em linguagem mais complexa e limita-se apenas à comunicação diária.
Há uma infinidade de indagações, questionamentos e estudos sendo feitos nesse exato momento sobre este tipo de mudança e quais as consequências que poderão causar, uma delas, certamente reside no fato da discriminação contra aqueles que escrevem corretamente que será encarado como extraterrestre a exemplo do filme Idiocracy.
Na educação,  de uma maneira geral, é necessário um estudo minucioso do fato  uma vez que o conhecimento cultural adquirido através de avanços paulatinos durante milênios vem mudando bruscamente, levando ao perigoso ponto de deixar de ser compreendido e submetendo a massa à ignorância e ao que é pior: ao domínio de poucos mais intelectualizados, fato perigoso do ponto de vista político, entretanto subestimado por todos.